Doi: https://doi.org/10.17398/2340-4256.15.691
Ruy Belo: Génio e sublime na
poesia portuguesa contemporânea
Ruy Belo: Genius and sublime in contemporary
Portuguese poetry
Luís Adriano Carlos
Universidade
do Porto
Recibido:
26/06/2019 Aceptado: 23/09/2019
Resumo / Resumen
O poeta português Ruy Belo
(1933-1978) publicou a sua obra nas décadas de 1960 e 1970. Viveu em Madrid
entre 1971 e 1977, exercendo funções docentes na Universidade Complutense. Um
dos seus mais conhecidos e celebrados poemas é uma meditação transcendente a
propósito do encontro de Garcilaso de la Vega com Dona Isabel Freire. Doutorado
em Direito Canónico, em Roma, com uma tese sob o tema “Ficção Literária e
Censura Eclesiástica”, viveria uma crise religiosa no início da década de 1960
que se repercute em toda sua poesia, vinda a público desde então e considerada
entre as mais importantes do século XX em Portugal. O presente estudo visa
determinar os aspectos essenciais que conferem à sua poesia uma dimensão maior,
de grande poder estético e emotivo, mediante a unificação das teorias do Génio
e do Sublime, que se integram intimamente nos seus versos poderosos de pendor versicular
e que provêm das origens do próprio pensamento poetológico ocidental.
Palavras chave / Palabras
clave: Estética Literária; Génio e Melancolia; Génio e
Sublime; Poesia e Transcendência; Ritmo, Verso livre e Versículo.
Abstract
The Portuguese poet Ruy Belo (1933-1978)
published his work in the 1960s and 1970s. He lived in Madrid between 1971 and
1977, teaching at the Complutense University. One of his best known and
celebrated poems is a transcendent meditation on the meeting of Garcilaso de la
Vega with Dona Isabel Freire. He has a doctorate in Canon Law in Rome, with a
thesis on "Literary Fiction and Ecclesiastical Censorship", and lived
through a religious crisis at the beginning of the 1960s that had repercussions
on all his poetry, which has been published since then and is considered one of
the most important of the 20th century in Portugal. This study aims to
determine the essential aspects that give his poetry a greater dimension, of
great aesthetic and emotional power, through the unification of the theories of
the Genius and the Sublime, which are closely integrated in his powerful verses
with a versicular slant and which come from the origins of Western poetic
thought itself.
Keywords: Literary Aesthetics; Genius and Melancholy; Genius and Sublime; Poetry
and Transcendence; Rhythm, Free Verse and Versicle.
Situando no centro dos Estudos
Literários o tema da Criação, inerente à Poética desde as suas fundações
originais, proponho-me defender uma tese segundo a qual Ruy Belo foi o poeta português
contemporâneo que sintetizou ao mais alto nível o impulso criador, quando a
vertiginosa aventura da Modernidade iniciada com o Romantismo parecia atingir
um estado de exaustão[1].
O tema da criatividade literária,
artística e científica está omnipresente no movimento geral da cultura, marcado
pela separação do conhecimento, como observa Giorgio Agamben, “entre um pólo
extáctico-inspirado e um pólo racional-consciente, sem que nenhum dos dois
jamais venha a eliminar completamente o outro”[2]. Neste longo debate, que já leva
dois milénios e meio, os conceitos de génio e sublime, símbolos e arquétipos da
Modernidade estética, em oposição à regra e ao belo ideal, gozam de uma
relevância privilegiada, uma vez que constituíram, no século XVIII, os principais instrumentos da resposta dos
“modernos” à derrocada do edifício clássico.
Ora, a poesia de Ruy Belo,
culminação e síntese, nas décadas de 1960 e 1970, do processo modernista
português iniciado pela geração de Fernando Pessoa em 1915, convida a unificar
as teorias do génio e do sublime, sem as quais não será possível compreender a
potência criadora e a natureza singular da sua poética no quadro da
Modernidade. Porém, estas duas teorias não
estão livres de alguns obstáculos doutrinários. Se o sublime não oferece
dificuldades de maior à sua compreensão crítica, embora muitas vezes
seja confundido com as noções de grandiloquência, pompa e majestade, já o conceito de génio é fonte de incontáveis
mal-entendidos, aparecendo não raro associado às ideias de fama, glória,
excepcionalidade moral e mesmo patologia mental, quando não é reduzido a uma
mera ficção romântica[3].
Desde logo, Ruy Belo aglutina as
duas grandes concepções do génio legadas pela Antiguidade, como que replicando
a síntese de Marsilio Ficino no tratado De
Vita, de 1489, ao harmonizar a tradição platónica do furor divino e da
inspiração com a tradição aristotélica e fisiológica da melancolia. A força
sobrenatural do entusiasmo, que
etimologicamente significa “trazer um deus dentro de si”, estabelece sinergias
inauditas com a disposição natural do humor melancólico ligeiramente inflamado[4]. Esta síntese teria no
entanto um desenvolvimento polémico até à génese do Romantismo, de que foi uma
das armas contra a preceptística horaciana dos clássicos, na medida em que,
como bem cedo anunciaria Joseph Addison, num breve ensaio sobre o tema do génio
em 1711, no n.º 160 do jornal The
Spectator, existem dois tipos de personalidades geniais: os de segunda
classe, que imitam modelos e autores, formados pelas regras e submetendo o
talento natural aos ditames da arte polida, conveniente e correcta; e os de
primeira classe, que imitam a natureza e são movidos por um “fogo natural” para “vastas concepções das coisas e nobres excursões da imaginação”[5].
Com
efeito, na sua evolução tumultuosa e contraditória, o Romantismo nem sempre
conseguiu produzir génios de primeira classe. Nos vários países europeus, o
novo movimento, ao longo do século XIX, esvaiu-se num sentimentalismo
convencional que vulgarizou o culto do génio enquanto
categoria estética e poética, dissolvida no simples biografismo antropológico.
O culto do génio transformou-se no culto do autor, praticado não só pela
crítica mas também pela nascente história literária. O impacto da Psicologia
experimental, da ideologia científica da degenerescência hereditária e do surto
dos intelectuais como portadores do conhecimento positivo descredibilizou o
conceito artístico de génio, a ponto de os múltiplos modernismos da “Belle
Époque”, frutos românticos por excelência, terem aberto uma profunda crise da
retórica da sinceridade e criado um novo tipo de culto: o da impessoalidade da
emoção estética, com T. S. Eliot, ou o do fingimento anticonfessional, com
Fernando Pessoa, para me cingir a dois dos exemplos mais representativos.
Também Ruy Belo sentiu os efeitos
do descrédito do génio romântico. É conhecido o belíssimo poema endereçado a
Herberto Helder, “Vat 69”, do livro Homem de Palavra[s], de 1970, cujo título joga a um
tempo com a data de composição, a marca de whisky
e a figura poética e profética do Vate. De facto, Ruy Belo desenvolveu uma
faceta muito crítica em relação ao tema do génio, a favor da arte e da sua
aprendizagem, documentada em vários textos. Por exemplo, no ensaio “Poesia
Nova”, de 1961: “O antigo vate romântico caiu em desgraça, passou de moda. Já
lá vai o tempo em que esse demiurgo era honrado por possuir o fogo poético”[6]. Num artigo de 1969, era
ainda mais preciso, com uma nota significativa que relegava o tópico teológico
da inspiração para uma esfera fisiológica: “Podemos saber qual é o maior poeta,
embora todo o poeta importe, desde que o seja. Mas o génio, o senhor da
inspiração — inspiração é apenas o acto de encher o peito de ar —, para o qual
tudo seriam facilidades [...], não, em boa verdade não sabemos o que seja”[7]. Por fim, em 1976, comentando a poesia de Nuno
Guimarães, qualificava a inspiração como “conceito fatal e pernicioso”[8].
Estas declarações foram
reforçadas por algumas referências
explícitas ao labor limae horaciano,
especialmente nos versos autobiográficos de “Cólofon ou Epitáfio”, em
que o poeta se autodescreve ocupado a “polir o seu poema”, e no prefácio à 2.ª
edição do mesmo livro Homem de Palavra[s], onde atribui especial
importância ao “trabalho de limar, emendar, corrigir, até conquistar a
naturalidade, se possível a simplicidade, que são uma conquista e não um dado gratuito dos deuses”[9].
Não obstante, em lugar nenhum assistimos à apologia de princípios externos e
abstractos de composição, as famosas regras racionalistas e normativas. O que
perpassa continuamente no seu discurso é uma adesão incondicional à ideia de
autonomia do poema enquanto objectivação da subjectividade original do poeta:
“é o poema que interessa”, afirmou, por exemplo, no artigo “Poesia e Educação”,
de 1968[10].
Todavia, o problema está longe de
se esgotar nesta ordem de argumentos. Numa leitura sistemática dos seus textos
críticos, encontramos uma constante dialéctica concentrada num esforço de
síntese teórica do génio e da regra, do ingenium
e da industria, da physis e da techné. O que Ruy Belo de facto contesta é o génio romântico, numa
recusa geral do platonismo que não é estranha à sua crise religiosa. De resto,
privilegia sistematicamente uma ideia de singularidade natural do acto poético.
Não faltam referências ao “génio” inovador, às “musas” como metáforas
quotidianas da vitalidade produtiva[11], ao “dom poético”[12] e ao “dom inato”[13] da criação. Por exemplo,
no mesmo ensaio “Poesia Nova”: “o poeta moderno, ao contrário dos clássicos,
não despreza a inspiração”[14]. Ou no importante artigo “Musa
Própria e Alheia”: “Sem querermos tomar
partido em antigas querelas, não há dúvida que a poesia se configura em
alto grau como um dom inato, embora peça
necessariamente um exercício que não consentirá ao poeta poisar a cabeça
seja onde for ao longo da sua vida”[15]. Ou ainda, no mesmo artigo
“Poesia e Educação”: “[...] as novas gerações, talvez como reacção contra a
crítica ou contra uma certa poesia, falam muito de ‘ofício’, de
‘profissionalização’, de ‘artesanato’. Mas é claro que isso pressupõe
qualidades inatas”[16].
“Musa Própria e Alheia”
oferece-nos aliás uma desassombrada apologia do talento individual, no sentido
de T. S. Eliot, reconhecendo que o ingenium
e a industria, longe de se excluírem,
pressupõem uma integração íntima, só possível nos poetas dotados de faculdades
essenciais como a temperatura e a intensidade: “A adopção de cânones —
declara o autor —, a não ser na obra daqueles que os criaram ou com eles se
fundiram a alta temperatura, jamais conseguiu encobrir a ausência de fogo
interior, por um lado, e de intensidade de expressão, por outro”[17]. Os
“autênticos poetas”, acrescenta, são aqueles que “só a uma norma íntima
obedecem”, irradiando o “resplendor que sempre envolve e acompanha uma voz
própria e pessoal”, fonte da “irresistibilidade de uma expressão”[18]. Num outro artigo de
1962, “Poesia e Literatura”, torna-se ainda mais explícita a valorização da
natureza, não a natureza ideal mas uma natura
naturans dotada do poder activo da criação: “O poeta, embora culto e senhor
da sua técnica, parte da realidade ou — como disseram os clássicos e nós
podemos voltar a dizer — imita a natureza. O literato parte quase sempre de um
ou vários livros, é imitador de uma imitação. Daí provém a palidez das suas
palavras, a pouca convicção e a arbitrariedade de tudo quanto diz”[19].
Fica assim autorizada a minha
perspectiva quanto às concepções perfilhadas por Ruy Belo acerca da criação.
Com forte evidência, o poeta não tardou a adquirir uma percepção nítida (e
angustiada) dos malefícios que podem resultar de um entendimento tecnocrático
da criação. No prefácio de 1972 à 2.ª edição de Aquele Grande Rio Eufrates, reconhece ter perdido “uma certa
ciência do abandono” com a aquisição progressiva da habilidade técnica,
deixando no ar o sentimento de uma contradição teórica, que a praxis da sua poesia tão orgânica
resolve por meio da integração de irregularidades e imperfeições como potências
naturais do fenómeno criador: “Para um poeta que, quanto à concepção do poema,
perfilha a doutrina designadamente de Horácio e de Sá de Miranda, dois eternos
autores de vanguarda, para um poeta que portanto só publica textos que, por os
haver longamente limado, tem por definitivos, não pode deixar de ser mau sinal
ver-se na obrigação de, num caso ou noutro, proceder a alterações. Mas talvez
lhe possa servir de consolação a ideia de que a perfeição é coisa de mortos”[20].
Recorde-se, a propósito, que
Horácio não elege apenas o “demorado trabalho da lima”. Utiliza também as
metáforas da “pedra de amolar”, do “arranjar das unhas” e do “frisar da barba”[21], recomendações que estão
na origem da poesia polida, geralmente medíocre, a que aludia Addison na sua
defesa do génio de primeira classe. Com formação jurídica e teológica, Ruy Belo
não ignorava que as leis e as regras são vontades isentas de paixão, como diria
o Aristóteles da Política. Nem
desconhecia, decerto, que a ideia do poeta engenheiro, proclamada por Edgar
Allan Poe, caminha em sentido contrário ao do único poeta engenheiro da sua
família, o apaixonado Álvaro de Campos que Pessoa criou como resposta ao
estoicismo apático do horaciano Ricardo Reis. Não surpreende pois que o
instinto poético de Ruy Belo procure na experiência do kairós o quid medium entre
a arte e a natureza da poesia, que a estética da Modernidade descobriu no sublime de Pseudo-Longino.
A sua obra manifesta, com
transparência, uma poderosa harmonia da componente artística do sublime, a
fabricação das figuras e a nobreza da expressão, com a sua componente natural e
primacial, a faculdade de elevação do pensamento e a intensidade da emoção
criadora de entusiasmo, que representam, na fórmula de Longino, “o eco da
grandeza interior” sem a qual não é possível a composição digna e elevada[22]. Poemas como A Margem da Alegria (1974) ou “Ao Regressar episodicamente a Espanha, em Agosto
de 1534, Garcilaso de la Vega Tem Conhecimento da Morte de Dona Isabel Freire”,
de Toda a Terra (1976), são exemplos
notáveis da genialidade sublime, revelando, por entre imagens de extrema
penetração emotiva, uma força apaixonada do estilo que muito deve a
negligências formais criadoras de sensações orgânicas, efeitos que Longino
considerou as fontes da simplicidade natural e da grandeza de expressão, acima
da vigilância técnica confinada à pequenez da minúcia. Neste sentido, os poemas
de Ruy Belo conservam os vestígios vivos do kairós,
a ocasião apaixonada que lhes deu o ser — ou as ocasiões sucessivas, mescladas
na síntese final —, graças à energia do tónus
anímico que lhes confere a tensão de uma anástase sem aparência de esforço e
oferece uma sensação de natureza, como se a arte
tivesse deixado de existir.
Estamos agora em condições de
perceber que um dos aspectos exaltantes desta poesia provém da tradição do
génio natural e do sublime, a tradição de Aristóteles e Longino, de que o
século XVIII se serviu para elaborar uma estética da energia e da intensidade,
sobretudo com Du Bos, Diderot, Burke, Duff, Gerard e Kant. Mesmo sem conhecer a
totalidade deste complexo doutrinário, ainda hoje obscuro nos Estudos
Literários, Ruy Belo realiza, no plano concreto dos poemas, a utopia de um
sujeito esteticamente emancipado que regressa à região sensível das palavras e
dos seus ritmos vitais, postulada pela Modernidade mas diluída no seu curso
evolutivo, embora poetas como Whitman, Álvaro de Campos e Allen Ginsberg, por
exemplo, nos tenham legado uma experiência viva desse empirismo poético da
imaginação. O génio natural da poesia, extremamente sensível nos versos de Ruy
Belo, é “o princípio vital que anima todas as espécies de composição”, como
esclareceu William Duff num ensaio de 1767[23]. O saber técnico é seu agente
ancilar, uma infra-estrutura subordinada ao seu poder produtivo, não
sobrenatural mas superestrutural, aspecto determinante para compreendermos a
questão da causalidade genial.
Se adaptarmos as categorias
causais de Aristóteles a esta reflexão, podemos estabelecer a existência de
quatro causas primeiras na génese do poema: a formal, a material, a eficiente e
a final. Ora, o génio está longe de ser uma causa formal, pois esta consiste
nas regras de composição e agenciamento. Também não é uma causa material,
composta pelos materiais que constituem o poema nos planos da expressão e do
conteúdo, a linguagem e a lexis, textos assimilados por leituras, circunstâncias e
motivos, representações temáticas e simbólicas. Não é ainda uma causa
final, a razão e o fim que fizeram nascer a necessidade do poema, geralmente a
comunicação estética. Bem entendido, o génio é uma causa eficiente, o princípio do movimento, a força motriz que agencia a passagem do possível à realidade,
dando-lhe forma própria e assim satisfazendo o telos. Como assinalava Aristóteles, a madeira não tem o
poder de fabricar a cama, nem o bronze pode engendrar a estátua, porque a
madeira e o bronze são meras causas materiais. Nem tão-pouco os saberes
técnicos do carpinteiro e do escultor conseguem criar só por si os dois
objectos, tal como a necessidade que os solicita. Nem, já agora, o dicionário e
a gramática em relação ao poema.
O génio é portanto o impulso
criador, o princípio da mudança e a causa eficiente, que adiciona matéria ao
nada inicial. Mas ele não se limita a criar o poema. Ele engendra as suas
criações de uma forma peculiar e distinta, sem a qual não poderíamos distinguir
o poeta e o poetastro ou a criação original e o fabrico em série. Isto não
significa que se trate do autor pessoal e civil, considerado na sua vida
prática e trivial, ou mesmo ruminando
quotidianamente os projectos e as ideias, também ele uma das causas
materiais do poema. Trata-se desse mesmo autor enquanto ser transfigurado pelo
entusiasmo do kairós — e, nessa
medida, trata-se já de um outro ser, num outro nível de consciência e
potencialidade, extensão criadora do homem e enteléquia do poema, elevado ao “grau supremo da síntese”,
vivendo intensamente “a mais pura compenetração que a natureza pode
fazer de si mesma”[24].
O génio acaba por sintetizar
todas as outras causas do poema, que nada seriam sem o sopro da sua actividade formadora. Ruy Belo ostenta entretanto uma
outra característica, que só encontramos nos autores de excepção: a síntese de
todas as faculdades intelectuais, num alto grau de conexão mútua e fusão
natural. Sensações, memória, entendimento e gosto são sujeitos a uma íntima
integração com a faculdade criadora por excelência, a imaginação, gerando uma
natureza fértil e penetrante que se sobrepõe à arte, em virtude do seu poder de associação de diferentes
percepções, característica que confere um vigor peculiar ao génio, tal como
explicou Alexander Gerard, em 1774, no seu ensaio fundamental sobre o tema[25]. Ruy Belo exibe este
vigor de forma aparentemente natural na generalidade dos seus versos. É porém
impossível citar e reproduzir aqui os melhores exemplos, dada a grande extensão
dos poemas. A Margem da Alegria, cuja leitura se prolongaria por não menos de duas horas
(compõe-se de 2168 versos), é um exemplo prodigioso de poder associativo e
sublimidade. Outros poemas recomendáveis seriam, por exemplo, “Vat 69”, de Homem
de Palavra[s], “Elogio de
Maria Teresa”, de Transporte no Tempo
(1973), “Em louvor do Vento”, “Muriel” e “Ao Regressar Episodicamente a
Espanha, em Agosto de 1534, Garcilaso de la Vega Tem Conhecimento da Morte de
Dona Isabel Freire”, de Toda a Terra.
Sem embargo, vejamos, do livro Homem de Palavra[s], a bela composição “Oh as Casas as
Casas as Casas”, de extensão relativamente breve:
Oh as casas as casas as casas
as casas nascem vivem e morrem
Enquanto vivas distinguem-se umas das outras
distinguem-se designadamente pelo cheiro
variam até de sala pra sala
As casas que eu fazia em pequeno
onde estarei eu hoje em pequeno?
Onde estarei aliás eu dos versos daqui a pouco?
Terei eu casa onde reter tudo isto
ou serei sempre somente esta instabilidade?
As casas essas parecem estáveis
mas são tão frágeis as pobres casas
Oh as casas as casas as casas
mudas testemunhas da vida
elas morrem não só ao ser demolidas
elas morrem com a morte das pessoas
As casas de fora olham-nos pelas janelas
Não sabem nada de casas os construtores
os senhorios os procuradores
Os ricos vivem nos seus palácios
mas a casa dos pobres é todo o mundo
os pobres sim têm o conhecimento das casas
os pobres esses conhecem tudo
Eu amei as casas os recantos das casas
Visitei casas apalpei casas
Só as casas explicam que exista
uma palavra como intimidade
Sem casas não haveria ruas
as ruas onde passamos pelos outros
mas passamos principalmente por nós
Na casa nasci e hei-de morrer
na casa sofri convivi amei
na casa atravessei as estações
respirei — ó vida simples problema de respiração
Oh as casas as casas as casas[26]
Ao contrário do que sucede com as
tendências clássicas e românticas, o poeta não dissocia a razão e a imaginação.
O entendimento preciso das relações de causalidade alia-se a uma imaginação
que, longe de se limitar a reproduzir percepções armazenadas na memória, “as
exibe como existências independentes produzidas por ela”[27], conferindo-lhes uma
nota original intensificada por um registo familiar regressivo, expressão
estilística de uma esfera de intimidade sublime. Este ponto é nuclear, pois o
segredo de Ruy Belo reside no recurso às faculdades intelectuais não
imaginativas como termostatos da imaginação. Por isso, o seu génio
característico, patente neste poema, é da ordem da simplicidade inesperada,
longe do génio extravagante naufragando em ondas de loucura ou do literato
cristalizando num racionalismo estéril. As faculdades da percepção, da memória
e do entendimento, assistidas pelo gosto, garantem a nitidez sensorial e
intelectual da imaginação meditativa, que
por sua vez lhes transmite colorido e vivacidade.
Uma outra causa eficiente provém
dos poderes de invenção e execução, interligados numa convergência simultânea,
durante o kairós, das principais
fases retóricas da elaboração, a inventio,
a dispositio e a elocutio. Os pensamentos parecem ser descobertos e verbalizados no
próprio processo da sua ordenação, assim contribuindo para o efeito raro e
difícil de uma simplicidade natural, em versos longos e poemas extensos de
grande complexidade. O caso mais representativo é ainda A Margem da Alegria, cuja composição exigiu uma longa fase de
descoberta, em torno do mito histórico de Pedro e Inês[28]. E, no entanto, o poema
é percebido como natureza animada por um sopro
anímico que lhe confere uma vitalidade excepcional. A experiência da sua leitura
faz sentir vivamente aquela facilidade
natural de que falava Du Bos a propósito do génio[29].
Podemos pois assumir que a vida
do poema é um “simples problema de respiração”, em virtude do primado do ritmo
sobre o metro como princípio do movimento organizativo, outro dos factores que
possibilitam a génese orgânica do génio natural e que criam as melhores
condições para confirmar a proposição de
Kant, na “Analítica do Sublime”: “Génio
é a inata disposição do ânimo (ingenium),
pela qual a natureza dá a regra à
arte”[30]. Aqui não existe
contradição entre a techné e a physis, porque a arte é produção por
meio de liberdade, através da qual realiza a síntese do sujeito e da natureza.
Subentende-se que o génio artístico detém os poderes da originalidade e da
exemplaridade, desconhecendo a regra no acto da criação mas fornecendo-a como
exemplo através da sua arte, e não por meio da ciência, o que explica a
dificuldade dos críticos em compreender os poetas
que reúnem condições excepcionais, empobrecendo muitas vezes a natureza
das obras com a projecção dos mesmos conceitos que aplicam às produções
menores. Ruy Belo reúne essas condições ao produzir ideias estéticas, poeticamente objectivadas, que traduzem a
natureza viva do sujeito e são por isso de difícil captação sob regras e
conceitos.
A originalidade e a exemplaridade
são contudo naturezas sujeitas às leis do tempo. Dizia Ruy Belo, nos primórdios
da sua carreira literária, que “o verso perde temperatura e rigor”[31] com a repetição dos
mesmos processos. É uma verdade que a história da literatura está habituada a
confirmar. Mas o interessante desta afirmação reside no motivo da
“temperatura”, um conceito físico e termodinâmico associado à energia, que não
integra as categorias da Poética e das disciplinas conexas. Mesmo assim, Ruy
Belo utilizou este termo como categoria de apreciação da qualidade estética de
obras literárias, além de ter consubstanciado o conceito na matéria sensível da
sua poesia, reconhecidamente calorosa e calorífica. Mais tarde, referiu-se à
necessidade de a “temperatura da expressão” ser “elevada”, como “única forma de
vigorar para além do momento que passa”[32]. Trata-se, como há pouco se
observou, de uma metáfora tradicional associada às descrições do estado de
genialidade sob as formas do “fogo” e do “entusiasmo”, que o empirista
Alexander Gerard, o mais consistente teorizador do génio, definiu como
“elevação e calor da imaginação”[33], de que o poder associativo
retira o vigor e a vivacidade. Segundo Kant, leitor atento de Gerard, o
entusiasmo “parece ser a tal ponto sublime”, pela “tensão das forças mediante
ideias que dão ímpeto ao ânimo”, que “sem ele nada de grande pode ser feito”[34].
Se agora relermos a Poética de Aristóteles, à margem das
simplificações de Scaliger e dos horacianos, constataremos que o Estagirita
está longe de reduzir a poesia à mera techné,
prevendo mesmo a sua integração com o entusiasmo irracional. No capítulo 17,
podemos ler que “a arte poética pertence aos seres bem dotados ou levados ao
delírio”[35]. No capítulo 22, o autor
afirma que “o mais importante de tudo é saber fazer as metáforas, porque isso
não se aprende nos demais e é o signo de uma natureza bem dotada”[36]. Se consultarmos a Retórica, deparamos com a mesma ideia:
“É sobretudo a metáfora que possui clareza, agradabilidade e exotismo, e ela
não pode ser extraída de qualquer outro autor”[37]. Finalmente, somos
surpreendidos por esta fórmula, que não consta dos manuais de Poética: “a
poesia é algo que provém da inspiração”[38]. Resumindo: se a propriedade
mais importante da poesia não pode ser racionalmente reproduzida, o poder que a
produz não é susceptível de ser traduzido por regras.
A intuição beliana da “temperatura”
como causa da criação original é confirmada num outro texto de Aristóteles, o
fecundo Problema XXX, 1, que
apresenta uma explicação da genialidade dos peritoi
ou seres excepcionais pela acção do humor melancólico, a bílis negra. O autor
centra-se na natureza fisiológica da disposição criadora, no ethos do poeta e no kairós, com o intuito de fazer comunicar o furor platónico e os
meios da mimesis. Em harmonia com os
ensinamentos hipocráticos, argumenta que os humores naturais — sangue, linfa,
bílis amarela e bílis negra ou melancolia — detêm o poder de moldar o carácter
e os temperamentos, tal como o vinho em situações momentâneas, por acção do
calor e do pneuma, sopro subtil que
refrigera o sistema orgânico. Ora, a melancolia é um humor frio e seco nos
casos patológicos, gerador de distimias, medo, ansiedade e tristeza. Porém, a
melancolia natural, existente nos homens que são melancólicos não por doença
mas por natureza, consiste numa mistura de calor
e frio, sendo portanto instável e variável. Quando a mistura é demasiado
fria, engendra distimias e caracteres
depressivos; quando aquece excessivamente, gera estados de euforia e
loucura; mas, quando a temperatura é bem regulada, restabelecendo o equilíbrio
pela acção refrigerante do pneuma, a
melancolia desperta os seres dotados de um
poder criador excepcional. É esta a ocasião propícia, o kairós, o momento de acesso a uma
segunda natureza, que afinal corresponde, nos termos de Gerard e de Kant, ao
bom equilíbro do frio entendimento e do calor da imaginação[39].
Segundo Jackie Pigeaud, este
texto introduz, pela primeira vez, o tema bem moderno da criatividade como pulsão que procura em nós uma segunda
natureza, oculta na obscuridade da nossa fisiologia, à espera do kairós. Devido à sua natureza instável,
a melancolia comporta o poder da etopoiese,
da modelagem dos comportamentos e dos caracteres, pondo-nos em comunicação com
o nosso thymos, lugar íntimo do Ser e
das emoções, centro da dor e da alegria. Por outras palavras, a etopoiese procede à integração íntima da
fisiologia e da retórica, pela translação do ethos através do tropo metafórico desencadeado pelo humor
melancólico[40]. Nesta perspectiva, a poesia de
Ruy Belo manifesta oscilações tímicas que explicam a mistura da tristeza e da
alegria em gradações muito matizadas, permanentemente sob o efeito da pulsão
etopoiética, e por isso jamais se fixando num lugar determinado. A distimia e a
atimia, o mal de vivre, a angústia, o
desespero, o desânimo, a pulsão da morte e o luto por si mesmo constituem os
materiais volitivos da faceta mais negra e sublime dos seus versos.
Estranhamente, e este é um dos
grandes efeitos de Ruy Belo, a temperatura nunca decresce quando o sistema
bipolar faz descer o poeta até ao fundo da depressão existencial. A causa
reside numa sabedoria da dosagem e da mistura dos humores, que aliás merece
melancólica jubilação numa espécie de salmo, “A Mão no Arado”, do livro O Problema da Habitação — Alguns Aspectos:
Feliz aquele que administra sabiamente
a tristeza e aprende a reparti-la pelos dias
Podem passar os meses e os anos nunca lhe faltará
Oh! como é triste envelhecer à porta
entretecer nas mãos um coração tardio
Oh! como é triste arriscar em humanos regressos
o equilíbrio azul das extremas manhãs do verão
ao longo do mar transbordante de nós
no demorado adeus da nossa condição
É triste no jardim a solidão do sol
vê-lo desde o rumor e as casas da cidade
até uma vaga promessa de rio
e a pequenina vida que se concede às unhas
Mais triste é termos de nascer e morrer
e haver árvores ao fim da rua
É triste ir pela vida como quem
regressa e entrar humildemente por engano pela morte dentro
É triste no outono concluir
que era o verão a única estação
Passou o solidário vento e não o conhecemos
e não soubemos ir até ao fundo da verdura
como rios que sabem onde encontrar o mar
e com que pontes com que ruas com que gentes com que montes conviver
através de palavras de uma água para sempre dita
Mas o mais triste é recordar os gestos de amanhã
Triste é comprar castanhas depois da tourada
entre o fumo e o domingo na tarde de novembro
e ter como futuro o asfalto e muita gente
e atrás a vida sem nenhuma infância
revendo tudo isto algum tempo depois
A tarde morre pelos dias fora
É muito triste andar por entre Deus ausente
Mas, ó poeta, administra a tristeza sabiamente[41]
Por estas razões
“administrativas”, a alegria, um dos tópicos emblemáticos da obra, nunca chega
a corresponder ao seu valor lexical paradigmático, dado ser submetida a
constantes efeitos do humor e do tropo, em oscilações bruscas que dois versos
do mesmo livro, O Problema da Habitação,
ilustram com simplicidade: primeiro, “a alegria é uma casa recém-construída”; algumas páginas depois, “a alegria é uma casa
demolida”[42]. Na verdade, a alegria
constitui uma metáfora à solta pela etopoiese
instável e dinâmica do humor: ora “um coração tristemente contente”[43], ora uma “alegria tão
forte que causava dor”, ora “essa margem que há antes da morte / ou só depois
da morte”[44]. Por conseguinte, caracterizar Ruy Belo como
poeta da alegria, sem mais, é correr o risco de o remeter para a emoção
superficial e ridícula dos temperamentos sanguíneos, que riem de tudo e de nada
a propósito de nada e de tudo, segundo a caracteriologia humorística. A menos
que se pretenda inscrevê-lo no tópico da alegria mística, o que, não sendo desprovido
de pertinência, é contudo redutor, porquanto a sua poesia exibe uma mescla de
tonalidades altamente contrastada, que podemos traduzir pela mistura de sangue
e melancolia, ou simplesmente pelo delight
de Edmund Burke, essa fascinação tingida de terror que caracteriza o sentimento
sublime[45]. Sem dúvida, esta alegria pode simbolizar o fogo
do entusiasmo e a força criadora, e afinal não é senão a alegria poética da
criação durante o kairós, de que o
poema é o registo, mas sempre com uma tintura de tristeza e um halo de
tragédia, a “íntima tristeza subjacente à mais feroz das alegrias” de que fala
o poeta no livro Toda a Terra[46]. Em suma, esta alegria é
a alegria sombria da melancolia, que Victor Hugo, no romance Les Travailleus de la Mer, de 1866,
sintetizou numa fórmula lapidar: La mélancolie, c’est le bonheur d’être triste.
Entretanto, a natureza de Ruy
Belo não se confina à esfera antropológica e fisiológica. Ela é também uma
cosmologia que regride em direcção à physis
pré-socrática dos elementos orgânicos e das configurações rítmicas. Os títulos
do primeiro e dos últimos livros, Aquele
Grande Rio Eufrates, Toda a Terra
e Despeço-me da Terra da Alegria
(1977), simbolizam a recorrência obsidiante das substâncias primordiais na
generalidade das composições. Embora não consista numa poesia elemental, à
semelhança das facturas epigramáticas do imagismo metafórico, os elementos
crescem de poema a poema como verdadeiras raízes,
no sentido original de Empédocles, ou como “hormonas da imaginação” que
desencadeiam todo um movimento de grupos de imagens em busca da expressão da
“intimidade da matéria”, na perspectiva de Gaston Bachelard[47]. O ar de Anaxímenes e o
fogo de Heraclito constituem as metáforas privilegiadas da poética do génio e
dos seus efeitos estéticos de alacridade sublime.
Por esse motivo, Ruy Belo é acima
de tudo um poeta heraclitiano. O ritmo dos movimentos contraditórios da sua
melancolia instável organiza-se não numa dialéctica hegeliana mas num fluxo
perpétuo, anterior à ordem e ao número, isento
do rigor mecânico das antíteses como as águas do rio Eufrates: “tenho no
movimento o meu sustento”, “sinto-me passar como a água corrente / como ela me
mostro móvel e instável”, escreve o autor em Toda a Terra[48]. No fundo, ele busca a unidade na discórdia — não
a unidade na concórdia, à maneira pitagórica e platónica, mas a própria
discórdia como verdade e unidade natural do Ser, que nem se unifica nem se
fragmenta, perdido algures entre os dois estados, como que no vazio atómico de
Demócrito. Daí que a etopoiese da sua
melancolia participe de uma fluidez que nenhum sistema heteronímico pode
satisfazer com a sua mecânica esquemática da alteridade. O problema da
habitação é este mesmo, a impossibilidade de repousar na própria mudança, como
sugere o poema “Estudo” de Homem de
Palavra[s]: “ser não outra coisa ser a própria mudança / ficar nesse mudar
com a possível estabilidade / e isso no passado e não nestas manhãs que me
consomem”[49].
Este passado é o país da
infância, onde toda a criança vive dentro da mudança e fala com as coisas como
se elas fossem pessoas vivas. Um mundo que o poeta experimentou, naturalmente,
na sua própria infância, mas que adquiriu um profundo sentido poético com a
leitura da Scienza Nuova de
Giambattista Vico. Podemos perceber o grau de influência desta obra
setecentista no seu pensamento pela leitura dos ensaios, em particular “Poesia
Nova”, cujo título foi moldado no de Vico. Neles sobressaem alguns dos grandes
princípios do filósofo italiano: o primado da palavra poética sobre a palavra
prática e do verso sobre a prosa; a origem metafórica e afectiva da poesia; a
faculdade poética como privilégio da infância; e a poesia como “exercício da
sabedoria da linguagem”, traduzida na “exploração intensiva da fala”[50].
Nos termos de Vico, a “sabedoria
da linguagem” é propriamente a sapienza
poetica do tempo dos heróis, anterior à idade dos filósofos, portanto
pré-lógica e pré-científica[51]. Emotiva e estética, ela radica numa metafísica
substancial que dá sentido e paixão ao
diálogo entre o corpo e a matéria vasta do universo, a terra, o mar e o
céu. Não admira que Ruy Belo tenha aderido incondicionalmente a esta visão da
história, que atribui aos heróis a condição de poetas naturais e sublimes,
senhores de uma faculdade inata para a criação poética, de que os textos
homéricos seriam a síntese suprema, ensinando-nos que “o trabalho mais sublime
da poesia é dar sentimento e paixão às coisas privadas de sensibilidade”[52]. Assim, ainda segundo
Vico, a infância do mundo é habitada pela memória e pela imaginação, pela força
expressiva das imagens, pelo paroxismo da dor e da alegria. Eis o mundo da
infância e da casa, da intimidade mais pura e absoluta, que impregna o transporte no tempo dos versos de Ruy
Belo, celebrado aliás com intensidade afectiva na longa anáfora que introduz A Margem da Alegria. Mais do que
recordação espiritual ou anamnese platónica à maneira de Wordsworth, trata-se
de uma vivência sensitiva a todo o instante experienciada pelo génio na
palpitação genesíaca dos versos, mas irremediavelmente perdida com o último
sopro do poema.
Em certo sentido, a poesia foi a
verdadeira infância de Ruy Belo. Nela disseminou a natureza, a casa, as ruas,
os campos, a humanidade e a sua nudez, a atmosfera e o ritmo que deu vida aos
elementos. No país poético da infância, todas as coisas se rodeiam de pneuma, o princípio vital que insufla
ressonância e vivacidade na matéria, concebido por Anaxímenes e Diógenes de
Apolónia na descrição naturalista do alento do mundo, equivalente ao spiritus latino, ao ruah’ hebreu, ao prâna
hindu e ao qiyun da estética chinesa.
O pneuma é o fundamento do tópico da
respiração que irrompe recorrentemente, e em várias modalidades, nos versos
projectivos de Ruy Belo, desde a simples metaforização fisiológica do princípio
vital, em conflito com a pulsão da morte, até à complexa meditação epidíctica
sobre a função respiratória do corpo, da casa e do universo, de que o longo
poema “Em louvor do Vento”, de Toda a
Terra, é o exemplo mais significativo, com uma atitude pneumática que estes três versos podem sintetizar
em pequena escala: “Deve haver algures no meu corpo um lugar
expressamente reservado para a voz do vento”; “Neste momento sou apenas sou
pelo menos desde os pés da cama até aqui à cabeceira a voz vasta do vento”;
“cresce o ritmo da minha respiração o pulso bate-me cada vez mais
apressadamente”[53]. Ao compor esta ode profundamente respirada, com
122 versos que rondam uma média de trinta a quarenta sílabas, incluindo o mais
longo de toda a sua poesia — o verso 20, de quarenta e cinco sílabas —, Ruy
Belo deu expressão sensorial à ideia estética nuclear da sua poética: a ideia
de uma poesia do pneuma contínuo como
causa eficiente, força motriz e energia rítmica na sua máxima síntese e
compenetração.
A poesia é de facto um “simples
problema de respiração”, graças à infusão do ânimo na matéria da linguagem pelo
pneuma contínuo que garante o alento
e a coesão do verso e do poema, propensos à dispersão em virtude da grandeza extensiva que os atrai na economia
geral da obra. Dificilmente Ruy Belo se teria tornado o grande mestre do
versilibrismo e do poema longo, estatuto que a crítica em geral lhe reconhece,
sem o princípio de coesão e o factor energético inerentes à natureza pneumática
do ritmo e dos seus dispositivos
paralelísticos (em especial, epanalepse, epanáfora, rima aliterante,
paronomásia, poliptoto e homeoptoto). Para fazermos uma ideia da
magnitude da empresa, os textos com mais de cem versos representam 55% do total
de 15.976 unidades versificatórias, mas correspondem apenas a 10% da totalidade
dos 289 poemas. Face a estes dados, não é difícil concluir que Ruy Belo
desafia, e acaba por vencer, o postulado de Edgar Allan Poe segundo o qual a
intensidade poética só é possível no poema breve, um dos lugares-comuns da
modernidade a partir do Simbolismo, e sobretudo entre os poetas da geração do
autor de Boca Bilingue (1966).
Esta poética é pois muito
dependente das configurações rítmicas, a ponto de nos proporcionar uma das mais felizes concretizações daquilo que
Meschonnic designa por ritmo prosódico-semântico, um movimento
subjectivo do discurso que afirma a historicidade singular do sujeito — não a
sua fala ou a sua escrita, mas a sua oralidade, um tom peculiar e
inconfundível, uma voz íntima e viva, uma pulsão, uma natureza literalmente
poética. O ritmo de que falo, e que condensa a vis poetica de Ruy Belo, filia-se na ideia subjacente ao rithmós de Heraclito e Demócrito, tal
como Benveniste o descreveu: um ritmo ainda puro do arithmós pitagórico que fundamenta a teoria rítmica de Platão,
baseada nos critérios da ordem e da medida, fundadores do esquematismo rígido
do sistema acentual canónico[54]. Em Ruy Belo, este sistema submete-se ao primeiro
dos três meios da mimesis
aristotélica, o ritmo ou fluxo das
formas móveis e momentâneas que transmite a sensação viva de uma orgânica da
linguagem, afectando sincreticamente os movimentos fónicos e semânticos do
discurso e da harmonia.
Eis a natureza íntima da poesia
resgatada por Ruy Belo: o ritmo como íman das palavras e das imagens, por meio
do qual, nos termos de Octavio Paz, o poeta encanta a linguagem[55]. E encantar a linguagem
é encantar o leitor, que pela experiência estética da natureza rítmica dos
pensamentos se resgata a si mesmo enquanto ser no mundo e para o mundo — não
este mundo automatizado, mas o mundo
realmente humano.
Génio e sublime são portanto fluidos rítmicos do espírito que animam
e vitalizam a matéria na ordem das suas representações verbais. Pela íntima
reconciliação da matéria e do espírito, desígnio primordial da poesia e da
arte, Ruy Belo introduz no coração do sensível um eixo de transcendência que desperta o sentimento de uma faculdade supra-sensível do ilimitado.
Tal sentimento é o sentimento do sublime, de acordo com Kant, correspondente a
uma força moral de resistência da imaginação que provoca na ordem finita da linguagem o estremecimento sagrado da comunhão íntima, mas fugitiva, do
quotidiano e do infinito. É esta aliança do sublime e do familiar que dá a nota
característica de Ruy Belo, através da oralidade afectiva da sua voz e de uma
heurística sem repouso da intimidade obscura das coisas e dos seres. Não são
raros os seus versos que geram comoção e estremecimento nos instantes
privilegiados da leitura, em que o estranho e o familiar mal se distinguem um
do outro. Nesses momentos, o génio de Ruy Belo encontra-se no apogeu das suas
forças e no ápice do seu spiritus,
exibindo o raro poder estético de elevação da intimidade geral a uma ordem do
particular que pode ser partilhada por todos.
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Departamento de Estudos Portugueses e Estudos Românicos
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4150-564 Porto (Portugal)
http://orcid.org/0000-0001-8005-9886
[1] Nascido e falecido em Portugal
(1933-1978), Ruy Belo licenciou-se em Direito e em Filologia Românica na
Universidade de Lisboa, tendo realizado entre as duas licenciaturas um
doutoramento em Direito Canónico com a dissertação Ficção Literária e Censura Eclesiástica (Pontificium Athenaeum Angelicum, Facultas Iuris Canonici, Roma,
1958). No início dos anos 1960, abandonou o Opus Dei e começou a publicar a sua
poesia com o livro Aquele Grande Rio
Eufrates, de 1961. Entre 1971 e 1977, exerceu funções de Leitor de
Português na Universidade Complutense de Madrid.
[2] Giorgio
Agamben, Stanze (Paris: Rivages, 1998), 10-11.
[3] Sobre a ideia de degenerescência e
nevrose epileptóide dos poetas e artistas promovida pela Psicologia
experimental e positivista no século XIX, são de destacar, desde 1820, os
trabalhos de Jean-Étienne Esquirol, Bénédict Morel, Moreau de Tours, Cesare
Lombroso, Francis Galton, J. F. Nisbet, William
Hirsch e, num plano de divulgação com efeitos massivos sobre os intelectuais
decadentistas e simbolistas do fim do século, Max Nordau. Ver:
Giovanni Bovio, El Genio (Barcelona:
Henrich, 1910); Luís Adriano Carlos, “Um Génio que não Era um Santo”,
Introdução a Ensaios Camilianos, por
Óscar Lopes (Porto: Fundação Eng. António de Almeida,
2007), 12-13; Penelope Murray, ed., Genius:
The History of an Idea (Oxford: Blackwell, 1989).
[4] O intenso debate travado no século XVI
em torno desta questão está profusamente documentado na monumental obra de Noel
L. Brann, The Debate over the Origin of
Genius during the Italian Renaissance (Leiden: Brill,
2002).
[5] Joseph
Addison, The Spectator, 1 (Londres: Everyman’s Library, 1907), 283-285.
[6] Ruy Belo, Na Senda da Poesia (Lisboa: Assírio
& Alvim, 2002), 84.
[7] Belo, “Da
Espontaneidade em Poesia”, em Na Senda, 108.
[8] Belo, “Nuno
Guimarães, Pastor da Palavra”, em Na Senda, 334.
[9] Ruy Belo, Homem de Palavra[s], em Todos os Poemas-I (Lisboa: Assírio
& Alvim, 2004), 245, 362.
[10] Belo, Na Senda, 102.
[11] Ruy Belo, “Entrevista 1”
(1960), em Na Senda, 22.
[12] Ruy Belo, “Advertência”
(1969), em Na Senda, 11.
[13] Ruy Belo, “Musa Própria e
Alheia” (1962), em Na Senda, 55.
[14] Belo, “Musa”, 86.
[15] Belo, “Musa”, 55.
[16] Belo, “Musa”, 102-103.
[17] Belo, “Musa”, 55.
[18] Belo, “Musa”, 54, 56.
[19] Belo, “Musa”, 60.
[20] Ruy Belo, Todos os Poemas-I, 19-20.
[21] Horácio, Arte Poética (Mem Martins: Inquérito,
2001), 89, 91.
[22] Dionísio Longino, Do Sublime (Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, 2015), 48, 50.
[23] William
Duff, An Essay on Original Genius (Delmar:
Scholars’ Facsimiles & Reprints, 1978), 25.
[24] Bovio, El Genio, 62, 74.
[25] Alexander
Gerard, An Essay on Genius (Munique: Wilhelm Fink Verlag, 1966), 7, 27.
[26] Belo, Todos os Poemas-I, 289, 290.
[27] Gerard, An Essay, 29.
[28] Sobre este assunto, é
imprescindível a demonstração exaustiva de Ana Maria Soares nos
dois volumes da sua dissertação de doutoramento, “A
Alegria e o Mal em Ruy Belo: Estudo da Composição Hipertextual d’A Margem da Alegria”, Universidade do Porto, 2017.
[29] Jean-Baptiste Du Bos, Réflexions Critiques sur la Poësie et sur la
Peinture (Genebra: Slatkine, 1993), 142 e toda a 1.ª Secção da 2.ª Parte, “Du Génie en général”.
[30] Immanuel Kant, Crítica da Faculdade do Juízo (Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1998), 211.
[31] Ruy Belo, “Poesia e
Literatura”, em Na Senda, 60.
[32] Ruy Belo, “Poesia e Luta
pelo Poder” (1972), em Na Senda, 311-312.
[33] Gerard, An Essay, 67.
[34] Kant,
Crítica, 171.
[35] Aristóteles, La Poétique (Paris: Seuil, 1980), 93 (55a).
[36] Aristóteles, La Poétique, 117 (59a).
[37] Aristóteles, Retórica (Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1998), 180 (1405a).
[38] Aristóteles, Retórica, 191 (1408a).
[39] Cf. Aristóteles, L’Homme de Génie et la Mélancolie: Problème
XXX, 1 (Paris: Rivages, 1988).
[40] Jackie Pigeaud, Prefácio a L’Homme de Génie et la Mélancolie, por Aristóteles (Paris: Rivages, 1988), 51-52.
[41] Belo, Todos os Poemas-I, 159-160.
[42] “Quasi Flos” e “Imaginatio Locorum”, em Belo, Todos os Poemas-I, 137, 144.
[43] Aquele
Grande Rio Eufrates, em Belo, Todos os Poemas-I, 130.
[44] A
Margem da Alegria, em Ruy Belo, Todos os Poemas-II (Lisboa: Assírio & Alvim, 2004), 227, 260.
[45] Edmund
Burke, A Philosophical Enquiry
into the Origin of Our Ideas of the Sublime and Beautiful (Oxford: Oxford University Press, 1998), 34, 47, 67,
122-123.
[46] “O Tempo Sim o Tempo Porventura”, em
Ruy Belo, Todos os
Poemas-III (Lisboa: Assírio & Alvim, 2004), 157.
[47] Gaston Bachelard, L’Air et les Songes (Paris: José
Corti, 1992), 19, e La Terre et les Rêveries du Repos (Paris: José Corti, 1992), 2-3.
[48] “Nem sequer não” e “Ao Regressar
episodicamente a Espanha, em Agosto de 1534, Garcilaso de la Vega Tem
Conhecimento da Morte de Dona Isabel Freire”, em
Belo, Todos os Poemas-III, 77, 150.
[49] Belo, Todos os Poemas-I, 304.
[50] “Poesia, Último Reduto da Literatura?”
(1972), em Belo, Na Senda, 317.
[51] Giambattista Vico, Principes d’une Science Nouvelle Relative à la Nature Commune des
Nations (Paris: Fayard, 2001), 32, 103, 157.
[52] Vico, Principes, 99.
[53] Belo, Todos os Poemas-III, 16.
[54] Émile Benveniste, “La Notion de ‘Rythme’
dans Son Expression Linguistique”, em Problèmes de Linguistique Générale, 1 (Paris:
Gallimard, 1981), 333-334.
[55] Octavio Paz, El Arco y la Lira (México: Fondo
de Cultura Economica, 1981), 53, 56.